Apologética

Falácias lógicas na argumentação

Existem diferentes tipos de falácias lógicas que as pessoas fazem ao apresentar suas posições.  

Abaixo está uma lista de algumas das principais falácias. É uma boa ideia estar familiarizado com elas, para que você possa identificá-las em uma discussão, focalizando os problemas nos quais elas pertencem e ao mesmo tempo expondo o erro. 

 É verdade que, durante um debate sobre um assunto, se você simplesmente aponta para o seu “oponente” uma falácia lógica que ele acabou de dizer, você já estará em vantagem.  

Mas meramente ter a vantagem não é o objetivo, pois na realidade, falácias lógicas escondem a verdade; então mostrá-las é muito útil. 

 A falácia do espantalho (ou boneco de palha – Strawman): Apresentar o argumento da outra pessoa de forma errônea por forma a atacá-lo mais facilmente. 
Ao exagerar, deturpar ou inventar o argumento da outra pessoa, é mais fácil apresentar a nossa própria posição como sendo razoável ou válida. Este tipo de desonestidade não só mina o discurso racional, como prejudica a nossa própria posição, já que põe em causa a nossa credibilidade. Se estamos dispostos a deturpar o argumento do nosso oponente de forma negativa, também estaremos dispostos a exagerar a nossa própria posição como positiva? 
Exemplo: O João diz que, no nosso país, deveríamos gastar mais dinheiro na Educação e Ciência, ao que o José responde: mas então tu odeias tanto o teu próprio país que queres deixá-lo sem Sistema Nacional de Saúde? 

 A falsa causa: Assumir que há uma relação real ou perceptível entre duas coisas significa que uma é a causa da outra. 

Um erro deste tipo é a falácia cum hoc ergo propter hoc (com isto, portanto por causa disto), em que assumimos que, porque duas coisas estão a acontecer ao mesmo tempo, então uma é a causa da outra. O erro está em ignorar a possibilidade de que pode haver uma causa comum a ambos os acontecimentos ou, como no exemplo abaixo, que as duas coisas em questão não têm qualquer relação causal entre elas e a sua relação aparente é apenas uma coincidência. Já tínhamos abordado esta falácia neste post. Outra variação comum é a falácia post hoc ergo propter hoc (depois disto, portanto por causa disto), em que assumimos uma relação causal porque um acontecimento se deu depois de outro e, portanto, o segundo deve ter sido causado pelo primeiro. 

Exemplo: Apontando para um gráfico catita, o Francisco mostra que as temperaturas têm vindo a aumentar nos últimos séculos enquanto que, ao mesmo tempo, os números de piratas têm vindo a diminuir. Logo, os piratas arrefecem o mundo e o aquecimento global é uma fraude. 

 O apelo à emoção: Tentativa de manipulação através de uma resposta emocional, em vez de um argumento verdadeiramente convincente. 

Os apelos à emoção incluem apelos ao medo, inveja, ódio, piedade, orgulho, entre outros. É importante assinalar que, por vezes, um argumento logicamente coerente pode inspirar emoções e ter um aspecto emocional, mas o problema e a falácia ocorrem quando a emoção é usada em vez de um argumento lógico ou como forma de ocultar o facto de que não existe nenhuma razão racional convincente para a posição que estamos a tomar. Todos, com exceção dos sociopatas, somos afetados pela emoção e, portanto, os apelos à emoção são uma táctica argumentativa comum e efetiva. Mas, em última análise, têm falhas, são desonestos, e tendem a fazer com que o nosso oponente se emocione. 

Exemplo: O Luís não queria comer brócolos, mas o seu pai disse-lhe para pensar nas pobres crianças famintas de África que não tinham qualquer comida para comer 

 A falácia da falácia: Assumir que, porque um argumento está mal construído ou uma falácia foi cometida, então está necessariamente errado. 

É muito frustrante ver alguém a debater ou argumentar mal uma posição correta. A maior parte das vezes, um debate ganha-se, não porque o vencedor tem razão, mas porque ele é melhor a debater que o seu opositor. Se formos honestos e racionais, temos que ter em mente que, só porque alguém cometeu um erro na sua argumentação, não significa necessariamente que o argumento, em si, esteja errado. 

Exemplo: Ao reconhecer que a Maria cometeu uma falácia ao argumentar que deveremos comer comida saudável porque está na moda, a Alice resolveu comer um duplo-hambúrguer com queijo e bacon todos os dias. 

 A falácia da “bola de neve” ou “rampa escorregadia” (slippery slope): Quando se constrói um argumento que dá a entender que se se permitir que A aconteça, então Z também vai eventualmente acontecer, pelo que A não deveria acontecer. 
O problema com este raciocínio é que evita enfrentar o tema e, em vez disso, desvia a atenção para uma hipótese extrema. Como não apresentamos nenhuma prova de que tal hipótese extrema vai de facto acontecer, esta falácia é semelhante à falácia do apelo à emoção, já que desencadeia o medo. Na verdade, o argumento está injustamente marcado por conjecturas não substanciadas. 
Exemplo: O Joaquim afirma que ao permitir o casamento de pessoas entre o mesmo sexo, então depois vamos acabar por permitir o casamento entre progenitores e filhos, entre pessoas e chimpanzés ou entre pessoas e carros. 

 O ataque à pessoa ou argumento ad hominem: Atacar o carácter do oponente ou alguma característica pessoal, em vez de enfrentar o seu argumento. 

Os ataques ad hominem podem tomar a forma de um ataque aberto a alguém ou, de um modo mais subtil, levantar dúvidas sobre o seu carácter ou atributos pessoais. O resultado desejado com um ataque ad hominem é minar o oponente sem realmente enfrentar o seu argumento ou apresentar um argumento próprio convincente. 

Exemplo: Depois de uma mulher fazer uma apresentação convincente de porque é que os impostos deveriam ser mais justos e equitativos, alguém pergunta à audiência se deveríamos acreditar numa mulher que não é casada, que até já foi presa uma vez e que tem um cheiro esquisito. 

 O apelo à hipocrisia ou Red herring : Evitar enfrentar uma crítica virando-a contra o acusador – responder a uma crítica com uma crítica. 

Literalmente, traduz-se como “tu também”. Esta falácia é frequentemente usada como uma eficaz manobra de diversão () porque retira o foco de atenção do acusado e desvia-o de novo para o acusador. A implicação é a seguinte: se o nosso oponente também faz aquilo de que nos está a acusar, então é um hipócrita. Independentemente de isto ser ou não verdade, o problema reside no facto de esta ser  efetivamente uma táctica de fuga ao reconhecimento e resposta à crítica. Ao virar a crítica contra o acusador, o acusado não precisa responder à acusação. 

Exemplo: A Natália nota que a Ana cometeu uma falácia lógica, mas, em vez de responder ao seu argumento, a Ana acusa a Natália de também ter cometido uma falácia lógica num momento anterior da sua conversa. 

 Incredulidade pessoal: Porque algo é difícil de entender ou não se sabe como funciona, então é provavelmente falso. 

Assuntos complexos, como a evolução biológica por seleção natural, precisam de certo grau de compreensão antes que os possamos abordar devidamente. Esta falácia é geralmente usada em substituição desse conhecimento. 

Exemplo: O Joaquim desenhou um peixe e um ser humano e, com um ar de deboche, perguntou ao Ricardo se ele realmente achava que as pessoas eram idiotas o suficiente para achar que o peixe tinha se transformado num humano por simples acaso. 

 Falácia da pergunta complexa ou “com rasteira” (Loaded question): Fazer uma pergunta que tem uma Assumpção incluída, de forma que não pode ser respondida sem aparentar erro. 

As falácias da pergunta complexa são particularmente efetivas no desvio de debates racionais devido à sua natureza “inflamatória”: o receptor da pergunta é levado a defender-se e pode parecer agitado ou “na defensiva”. Não só esta falácia é também um apelo à emoção, como traiçoeiramente enquadra o argumento de uma forma enganadora, como uma espécie de falácia do espantalho preventiva. 

Exemplo: A Graça e a Margarida estão interessadas no Bruno. Um dia, estando o Bruno na roda ou ouvindo a conversa, a Graça pergunta com um tom inquisitivo: “Margarida, você está tendo problemas com drogas?”. 

 Falácia da inversão do ónus da prova: Dizer que o ónus da prova não compete à pessoa que fez a afirmação, mas qualquer outra pessoa que a queira negar. 

O ónus da prova recai em quem faz uma afirmação e não em quem a quer falsificar. A incapacidade, ou a falta de vontade, para falsificar uma afirmação não a torna válida, nem lhe dá qualquer credibilidade. No entanto, é importante notar que nunca podemos estar certos de algo e, portanto, temos que avaliar todas as afirmações com base na evidência existente. Descartar algo apenas porque ainda não foi provado, é também um raciocínio falacioso. 

Exemplo: O Bernardo declara que há um bule a orbitar o Sol, entre a Terra e Marte. Como ninguém pode provar que ele está errado, a sua afirmação é, portanto, válida. 

 Falácia da ambiguidade: Usar um duplo-sentido ou linguagem ambígua para induzir em erro ou deturpar a verdade. 

Os políticos são muitas vezes peritos em usar a ambiguidade para induzir em erro e mais tarde, caso sejam questionados, explicam como, tecnicamente, não estavam mentindo. A razão pela qual este tipo de estratégia é uma falácia é que é intrinsecamente uma deturpação da verdade. 

Exemplo: A Margarida promete entregar o projeto até ao fim do mês ao diretor. Quando o mês chega ao fim, o diretor pergunta pela tarefa, mas a Margarida explica que não está atrasada, porque o prometido é que terminaria o projeto até ao final do mês… seguinte. 

Falácia do jogador: Achar que há alguma tendência por trás de fenómenos estatisticamente independentes. 

Diz-se que esta falácia, em que muitos acreditam, pode ter dado origem a uma cidade no meio do deserto de Nevada nos Estados Unidos da América.  

Apesar da probabilidade da “mudança na sorte” ser baixa, cada nova jogada na roleta é completamente independente da anterior. Logo, embora possa haver uma pequena probabilidade de atirar a moeda ao ar e sair “coroa” 20 vezes seguido, a probabilidade de sair “coroa” em cada uma dessas jogada continua a ser 50/50 e não é influenciada pela tentativa anterior. 

Exemplo: Em seis jogadas de roleta, saiu sempre vermelho, portanto o Rui estava quase seguro que depois sairia preto. 

Ao pensar desta forma, estava a sofrer de uma espécie de “seleção natural da económica”, e rapidamente ficou sem dinheiro algum. 

 Apelo à popularidade ou argumento ad populum (Bandwagon): Como forma de validação, apelar à popularidade de uma afirmação ou ao fato de muitas pessoas praticarem determinado ato. 

A falha deste argumento é que a popularidade de uma ideia não tem qualquer relevância para a sua validade. Se tivesse, então a Terra teria sido plana durante a maior parte da história, para se ajustar à crença popular. 

Exemplo Quando em Roma, aja como um romano. 

 Apelo à autoridade ou argumento ad verecundiam: Usar, como argumento, a posição ou a opinião de uma figura ou de uma instituição de autoridade. 

Em relação a esta falácia, é importante notar que as autoridades em determinados campos têm argumentos válidos e que não deveríamos desprezar a experiência e sabedoria de outras pessoas. No entanto, para formular um argumento, uma pessoa deve defender-se com o seu próprio mérito, ou seja, há que saber por que é que a pessoa com autoridade toma uma posição em particular.  

Mas, claro que é possível que uma pessoa ou instituição com autoridade estejam erradas. Portanto, a autoridade dessa pessoa ou instituição não tem qualquer relevância intrínseca na verdade ou falsidade das suas afirmações. 

Exemplo: Como não podia defender a sua posição de que a evolução “não é real”, o Roberto alega que conhece cientistas que também questionam a evolução (e que presumivelmente não é um Primata) 

 Falácia da composição: Assumir que uma parte se aplica ao todo ou a outras partes da mesma coisa. 

Por vezes, quando algo é certo para uma parte, também se aplica ao todo, mas a diferença crucial é ter evidência que demonstre que esse é o caso. Como observamos consistência nas coisas, o nosso pensamento pode tornar-se enviesado, de forma a assumirmos consistência onde ela não existe. 

Exemplo: As células não têm consciência. Portanto, o cérebro, que é feito de células, não tem consciência.  

 Falácia genética: Julgar algo como bom ou mau tendo como base apenas a sua proveniência. 

Esta falácia evita a argumentação, desviando o foco de atenção para a origem da coisa ou da pessoa. É semelhante à falácia ad hominem já que usamos a percepção negativa pré-existente para dar a entender que o argumento da outra pessoa está errado, sem realmente apresentar motivos válidos para a falta de mérito do argumento. 

Exemplo: Acusado no Telejornal de corrupção, o deputado diz que deveríamos ter muito cuidado com o que aparece na televisão porque todos sabem que a imprensa pode não ser de confiança. 

 Falácia do falso dilema ou falsa dicotomia: Apresentar dois estados alternativos como sendo as únicas possibilidades quando, na verdade, existem mais. 

Esta táctica insidiosa tem a aparência de um argumento lógico, mas, se analisarmos o caso com cuidado, torna-se evidente que há mais possibilidades que a dualidade que é apresentada. O pensamento binário de “preto ou branco” não permite contemplar as muitas variáveis, condicionantes e contextos nos quais existiriam mais que as duas possibilidades apresentadas. Enquadra o argumento de uma forma enganadora e ensombra o debate honesto e racional. 

Exemplo: Numa campanha para reunir apoio ao seu plano, que iria diminuir os direitos fundamentais do cidadão, o Líder Supremo advertiu o seu povo que, ou estavam do seu lado, ou estariam do lado dos inimigos do país. 

 A falácia da petição de princípio ou do argumento circular (Begging the question): Apresentar um argumento circular, no qual a conclusão está incluída na premissa. 

Este argumento sem coerência lógica surge muitas vezes em situações nas quais assumimos algo que está muito entranhado e que, portanto, é dado como um facto. Usamos como prova, aquilo que estamos a tentar provar. A argumentação circular é má, principalmente porque não é muito boa. 

Exemplo: As palavras de Odin são verdadeiras e infalíveis. Sabemos isso porque assim o diz no “Grande Livro de Odin, O livro das coisas boas e verdadeiras que não devem nunca ser questionadas”. 

 Falácia do naturalista ou apelo ao natural: Argumentar que, porque algo é natural, é portanto válido, justificado, inevitável ou ideal. 

Só porque algo é natural, não significa que seja bom. Por exemplo, o assassinato é muito natural, mas a maioria de nós concordará que não é algo que se deva fazer ou que a sua “naturalidade” sirva de justificação.  

Exemplo: Um curandeiro chegou à aldeia oferecendo como solução para as doenças vários remédios naturais, como uma água muito especial. Dizia que as pessoas deveriam ter cuidado com os remédios artificiais, como os antibióticos. 

(Nota: muitos antibióticos são, na realidade, de origem natural) 

 Falácia do atirador certeiro (The Texas sharpshooter):  

Selecionar os dados de forma a que se ajustem ao argumento ou procurar um padrão que se ajuste à hipótese. 

O nome desta falácia de “falsa causa” advém do exemplo de um atirador que dispara aleatoriamente a vários celeiros e depois desenha o alvo onde há mais buracos de bala, dando a entender que é muito bom atirador. A aglomeração de dados pode dar-se naturalmente por acaso e não indica necessariamente uma relação causal. 

Exemplo: Os fabricantes de uma determinada marca de sucos afirmam que uma pesquisa indica que, dos cinco países onde é mais consumido este suco, três são dos mais saudáveis do mundo. Logo, o o suco desta marca é bom para a saúde. 

 Falácia do meio termo: Argumentar que a verdade está no compromisso, ou no meio termo. 

O argumentum ad temperantiam consiste em afirmar que o meio-termo entre duas propostas é a melhor solução. Este argumento é normalmente evocado quando duas ideias opostas são defendidas por grupos de tamanho semelhante. A falha do argumento vem de pressupor que os extremos são necessariamente errados e que o meio-termo é verdadeiro. 

Exemplo: Um grupo de pessoas isoladas da luz solar possui um relógio análogico que indica dez horas. Alguns argumentam ser dia, outros argumentam ser noite. O argumento da moderação seria considerar como verdadeiro que são dezesseis horas, o ponto médio entre 10h e 22h. 

Matt Slick

Matt Slick é o presidente e fundador do Christian Apologetics and Research Ministry. Formado em Ciências sociais pelo Concordia University, Irvine, CA, em 1988. Bacharel em ciências da religião e mestre em apologética pelo Westminster Theological Seminary in Escondido, Califórnia